Entrevista – ‘Guerra aberta’ com os pilotos

presidente_tap.jpgFernando Pinto, CEO e presidente-executivo
“O protesto dos pilotos apanhou a Tap de surpresa”

Visivelmente preocupado com os reflexos da acção de protesto dos pilotos na actividade da TAP, o presidente do conselho executivo, Fernando Pinto, admite que o resultado positivo previsto para 2006 está em risco.

P A TAP regressou aos lucros em 2006? R Até metade do ano, 2006 foi de grande preocupação. Mostrava perdas muito fortes, superiores às previstas no orçamento. Foi um ano muito difícil, não por dificuldades de tráfego, pelo contrário – conseguimos vendas superiores às do ano anterior – mas, principalmente, devido ao problema do preço do petróleo, que chegou a atingir a faixa dos 78 dólares por barril, elevando o preço do combustível para aviação a valores nunca antes imaginados.

P Que valor tinham orçamentado no início do ano?

R Na casa dos 62 dólares por barril e, mesmo assim, já ficava um orçamento apertado. O nosso contra-ataque foi através do crescimento. Fomos buscar aviões (três Airbus A330) e foi muito difícil consegui-los no mercado. Havia 25 empresas interessadas nestes três aparelhos, mas a TAP acabou por vencer. Introduzimos estes aviões em rotas de longo curso a partir do Porto. Essas rotas deram certo. Foi um dos pontos extremamente positivos. Por outro lado, fizemos uma reestruturação do nosso sistema de tarifas para poder competir no mercado de «low cost» e deu certo. Mantivemos um «load factor» (ocupação dos assentos) bastante elevado e, ao mesmo tempo, a média do preço não decresceu. Tivemos um crescimento importante da Star Alliance nos passageiros «business» de tarifas fortes, nomeadamente, dos EUA.

P Qual foi a percentagem de reencaminhamento da Star Alliance para TAP?

R Não tenho ainda esse número, mas imaginámos que a Star Alliance, no ano passado, viesse a contribuir com 30 milhões de euros de aumento de receita. Hoje, estimamos que ultrapassou esse valor. Acabámos por crescer em assentos oferecidos (14,9%), em tráfego de passageiros (8%) e em passageiros/quilómetro (15,7%). Um pouco superior à oferta. Mostra como estavam correctas as nossas estimativas e os mercados onde actuámos. As coisas melhoraram a partir de Junho. Tivemos crescimentos importantes. Os resultados saltaram rapidamente e eu direi que estava bastante optimista em Outubro, em relação aos resultados da empresa. Já Novembro não foi tão bom e Dezembro foi um pouco abaixo da nossa expectativa.

P Porquê? Costuma ser um mês forte?

R É forte a partir da segunda quinzena. Este ano, tivemos a influência desta movimentação dos pilotos, que trouxe prejuízos à operação: descontinuidade; passageiros que não marcaram voos connosco; a quebra de vários voos que tivemos de cancelar; tivemos de contratar empresas para os executar; e isso pode ter prejudicado a actividade da TAP. A que nível? Ainda não sabemos e até podemos chegar a um ponto de não atingir o resultado.

P Pode comprometer o resultado positivo de 4,1 milhões de euros previsto para 2006?

R Sim. Houve uma influência relativamente forte na operação.

P Mais do que a TAP esperava?

R A TAP não esperava nada, não imaginava qualquer tipo de movimento, uma vez que não era um problema com a TAP. Nós tínhamos a convicção de já ter ultrapassado essa era. A TAP não está preparada para isto. A TAP é uma empresa extremamente sensível, trabalha num mercado marginal mínimo. Consegue retirar lucratividade no limite e qualquer movimentação deste tipo prejudica-a largamente. Todo o trabalho de crescimento que temos feito nos últimos tempos assenta na estabilidade da empresa. E, principalmente, os nossos passageiros acreditam no produto que nós entregamos. Que não vamos deixá-los na mão, principalmente, num momento de férias, de festa…

P Houve um esforço da TAP para tentar resolver o problema?

R Com atrasos, sem dúvida nenhuma, alguns de várias horas. A TAP contratou aviões porque o objectivo era o passageiro não ser prejudicado. Este não é um diferendo com a TAP, nem com o passageiro.

P O Sindicato dos Pilotos da Aviação Civil anunciou que iria manter esta acção de protesto até ao dia 15 de Janeiro. Já tem uma noção do que acontecerá depois? Tem havido conversações?

R Essas conversações não são connosco. O protesto não é contra a TAP, mas contra uma acção do Governo. Mas, infelizmente, está a ser feita de uma forma que prejudica a TAP e isso é preocupante para nós. Confesso que, como gestor da empresa, me deixa muito preocupado e não muito seguro em termos de futuro, de investimento e de crescimento.

P Porque deixou de contar com a flexibilidade dos pilotos?

R Exactamente. Não podemos, de uma hora para a outra, ser apanhados de surpresa. Imagine ter mais três aviões A330 e este tipo de surpresa. A isso, a empresa não resiste!

P Especialmente nos próximos anos, tendo em conta o novo modelo de «governance» da TAP e de gestão por objectivos? São objectivos ambiciosos?

R São objectivos. Se são atingíveis ou não, não sabemos. Em geral, num plano destes, as metas são extremamente agressivas. É um desafio. Matematicamente, temos dificuldades em chegar lá e um dos caminhos é o crescimento da oferta, que pode ser muito benéfico, por um lado, mas prejudicial, por outro. Pode tirar-nos resultado.

P O ministro Mário Lino revelou que os objectivos foram previamente discutidos com o conselho de administração?

R As metas são estas, sem dúvida nenhuma. Depende das condições de mercado…

P Não é uma pressão excessiva?

R O máximo que acontece num casos desses, é não atingir a meta. Há metas anuais e trianuais.

P O Governo quer privatizar a TAP em 2007. Tendo em conta outros processos de privatização, parece-lhe realizável?

R O processo não é curto, leva tempo. Tem a ver com o trabalho do Governo, é uma decisão política e nós temos de trabalhar em conjunto para isso. Mas, como disse o nosso ministro, se não for em 2007 será em 2008.

P Tem ideia de qual vai ser o modelo de privatização? Vai ser parcial?

R Pelo menos, é o que ainda está no decreto.

P Está previsto, há longos anos, um acordo com os pilotos em que eles poderiam vir a ter entre 10 a 20% da empresa em caso de privatização. Este acordo ainda se mantém?

R Isso é da empresa de transporte aéreo. Em princípio, sim. Tem de ser analisado em termos de processo.

P Se os pilotos fossem já parte da estrutura accionista da empresa, isso poderia ajudar a solucionar este problema que prejudica a actividade da empresa?

R Não é preciso. Todos nós dependemos da TAP. Ninguém quer o mal desta empresa. O maior bem que, hoje, os nossos pilotos têm é serem respeitados, não só pela empresa como um todo, mas principalmente, pela opinião pública e pelo Governo. Eles não precisam deste tipo de movimento para serem ouvidos.

P Uma das condições para alcançar os objectivos é o negócio com a Portugália se concretizar?

R É muito importante, sem dúvida nenhuma. Dentro do planeamento estratégico, temos várias áreas de actuação. Uma delas é aquisição da Portugália.

P Qual vai ser a participação e o peso da PGA para esses objectivos?

R É responsável por uma parte importante, não sei dizer percentualmente quanto, mas uma parte importante desse crescimento da empresa, porque nos permite trazer passageiros de outras origens.

P A marca Portugália vai manter-se?

R Sem dúvida. Também estamos a comprar um mercado muito ligado à marca Portugália, que fez o seu nome – é um nome respeitado -, por cinco vezes recebeu o prémio de melhor empresa regional da Europa. Não faz nenhum sentido comprar a empresa e tirar-lhe o nome. É uma das coisas importantes que estamos a comprar.

RESULTADOS:

  • 14 milhões de euros, é o resultado líquido estimado para a TAP, em 2006, face ao prejuízo de 9,9 milhões de 2005
  • 47,9 milhões de euros, é a meta fixada para o resultado líquido da TAP, em 2007, pressupondo um aumento de 33,9 milhões, relativamente a 2006
  • 74,7 milhões de euros, é o valor inscrito nos objectivos globais anuais do Grupo TAP para 2008, com um aumento de 26,8 milhões de euros, face aos resultados líquidos de 2007
 [(c)Expresso Ed. Impressa – Economia – Edição 1785 de 13.01.2007]